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Apresentação sobre o Evento

Coordenação científica e pedagógica:
Professor Dr. João Salm e Professora Dra. Raquel Domingues do Amaral

O tempo presente se caracteriza pela incerteza, imprevisibilidade e instabilidade que se expressa em toda a sociedade, exigindo mudanças de natureza política, social e econômica. Essas demandas por mudanças também se refletem em nossas instituições, principalmente nas categorias e conceitos que nos permitiram o estado estável em nossas sociedades.

Entre essas demandas por mudança em categorias e conceitos se encontra o questionamento que se faz ao entendimento do que seja a justiça e ao modo de operacionalizar a sua execução na sociedade. De fato, desde os clássicos gregos até os nossos dias, as discussões em torno da palavra justiça mereceram infindáveis elaborações, aperfeiçoando-se não só o que se entende por justiça, mas também a forma como ela é exercida e aplicada na sociedade.

No entanto, esse entendimento e essa forma já não se mostram mais suficientes para que a justiça seja compreendida, aceita e realizada por todos. É a justiça, como uma instituição, que está no centro dos questionamentos, não a sua essência substantiva. Aqui se coloca o termo instituição como uma crença que permite o estado estável na sociedade, não o entendimento convencional das burocracias como estratégias que aplicam a justiça. Portanto, os questionamentos que se fazem à justiça como instituição estão além da burocracia que a leva à prática.

Esses questionamentos têm merecido diversas respostas que procuram explicitar o entendimento do que é a justiça e a forma mais adequada de aplicá-la. Entre essas respostas se encontra a proposta da Justiça Restaurativa.

A Justiça Restaurativa não pretende apresentar um novo entendimento do que seja a justiça, nem ser uma panaceia para todos os males em sua realização, muito ao contrário, ela pretende resgatar as diversas discussões e elaborações sobre a justiça, desde os primados clássicos até os nossos dias, resgatando um entendimento substantivo do que é a justiça, fato que pode ter perdido o brilho ao longo do tempo. Assim, se entende por Justiça Restaurativa um conjunto de princípios e práticas, que, por meio da participação, engajamento e deliberação, possibilitam construir a justiça de forma coletiva. Dessa forma de se conceber a justiça se ressalta os seus valores humanizantes, relações, a responsabilidade individual e coletiva, o trato ao dano e a fortalecimento da comunidade.

Quanto à forma de se aplicar e implementar a Justiça Restaurativa resta observar que o momento presente se constitui em um tempo de transição entre uma forma de articulação social e outra em construção que tem a oportunidade de escolha entre múltiplas possibilidades objetivas de realização. No momento presente, portanto, não se pode oferecer presságios acerca do futuro e de sua construção sob pena de se macular o sagrado dever de perseguir sempre os primados da ciência.

Ainda assim, já é possível verificar a relevância da Justiça Restaurativa na transformação de conflitos envolvendo a infância e a juventude, na área criminal e, principalmente, nas questões socioambientais.

A justiça restaurativa ambiental tem desempenhado um relevante papel na transformação de conflitos envolvendo comunidades tradicionais, a administração pública e empresas, ao oferecer ferramentas eficazes para a criação de espaços seguros de diálogo e interação entre as partes interessadas, principalmente no que concerne à transformação de conflitos decorrentes das demandas de desenvolvimento regional por grandes obras de infraestrutura localizadas em áreas de alta sensibilidade ecológica.

As ferramentas da justiça restaurativa podem contribuir não só para a transformação de conflitos e reparação de danos ambientais como também para a cocriação de políticas e estratégias de regulação ambiental pelas partes interessadas de um ecossistema. Isso porque a natureza e os recursos naturais são vistos de formas muito diferentes pelas partes interessadas em um conflito ambiental. Enquanto as empresas têm uma visão instrumental dos recursos naturais apenas como matérias-primas, para o Estado, os recursos naturais são recursos nacionais a serviço de políticas de desenvolvimento da economia e do progresso social. Já para os povos originários e tradicionais, a natureza tem subjetividade e valor intrínseco e está interconectada com suas próprias existências e identidades culturais.

Essas diferentes visões sobre a relação humana com o meio ambiente geram conflitos entre as partes interessadas, podendo inviabilizar o desenvolvimento sustentável de uma determinada região, quando esses conflitos são judicializados. Assim, as ferramentas da justiça restaurativa ambiental podem oferecer espaços seguros, economicamente viáveis e democráticos para o diálogo com o propósito de transformar os conflitos por intermédio de estabelecimento de consensos entre as partes interessadas.